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O historiador Fernando Rosas afirma que “está em curso”, nas diferentes sociedades, “uma disputa centrada nos conteúdos das representações do passado, sobretudo do passado recente”.
O historiador de 70 anos faz esta afirmação naquela que foi a sua “última lição”, proferida em abril último, na Universidade Nova de Lisboa, e agora publicada em livro pela editora Tinta-da-China, numa edição que inclui uma “nota de apresentação” pela egiptóloga Maria Helena Trindade Lopes, um perfil do catedrático traçado por Luís Trindade, do Birkbeck College, da Universidade de Londres, e ainda um artigo do ex-líder do Bloco de Esquerda Francisco Louçã, “As crises refundadoras e a política de emancipação”.
A obra inclui também uma conversa com Fernando Rosas sobre “Fazer a História do Estado Novo”, área em que este investigador se especializou, conduzida por Luís Trindade, e a “bibliografia principal” de Rosas, que inclui títulos como “Salazar e o poder. A arte de durar” e “O Estado Novo: 1926-1974”, que constitui o 7.º volume da História de Portugal, de José Mattoso.
“História, (des)memória e hegemonia” foi o tema da última lição do professor catedrático do Departamento de História da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova, mas Rosas, na sua alocução adverte que, no seu caso, “esta não é a última lição”.
“Desde logo, porque aceitei o convite da Faculdade para continuar a lecionar a cadeira de História dos fascismos na Europa, por mim criada há alguns anos. Depois, porque, como investigador do Instituto de História Contemporânea [desta universidade], como historiador e como cidadão, não tenho qualquer intenção de me reformar”, esclarece Fernando Rosas, que cita Teresa Rita Lopes para atestar: “De uma verdadeira missão, nunca ninguém se reforma”.
Helena Trindade Lopes, por seu turno, não tem dúvidas e afirma no seu texto que na Universidade Nova, designadamente no departamento de História, o seu nome “estará inscrito e gravado com letras garrafais e palavras eloquentes”, de tal forma considera se ter destacado o contributo de Fernando Rosas, que descreve como “brilhante investigador” e “extraordinário comunicador”.
Rosas, refere Trindade Lopes, foi o “iniciador” da História do século XX, e refere também a sua participação na vida política, apontando-o como um “político experiente e arguto”.
Na sua lição, Fernando Rosas afirma que as “disputas centradas nos conteúdos das representações do passado” são “suscetíveis de fundar ou refundar as legitimidades ideológicas e políticas do presente e do futuro”.
“É um combate pela hegemonia ideológica, pela ‘conquista das almas’ que precedeu, preparou e acompanhou a crise paradigmática ocorrida nos dois mundos do pós-guerra: a crise do capitalismo neokeynesiano, regulador, providencialista, centralista e politicamente rotativo ao centro, cujo modelo foi brutalmente sacudido pela Grande Depressão de 2008/09, e a crise dos modelos soviético e chinês do socialismo real, que desaguou em modalidades específicas de restauração nesses países e no vasto campo político que polarizavam a nível mundial”.
Uma transformação, atesta o historiador, que não podia ser feita “sem uma prévia preparação ideológica ao nível das visões dominantes da sociedade e da cultura”, nomeadamente através da “imposição de um outro senso comum como suporte socialmente viabilizador do novo curso”.
No âmbito da sua “lição”, o catedrático debate ainda a “História e o uso público da História”, certo de que esta não é “uma ‘coisa’ em si mesma, jazente inteiriça e passiva sob as poeiras do passado”.
Daí, prossegue, “os diferentes tipos de investimento em torno da memória” que “é sempre matéria-prima para arquiteturas de geometria variável, invariavelmente construídas a partir do presente”.
Os “usos públicos da História” têm, afirma Rosas, “tantas cores, da direita à esquerda, quanto as conceções que as inspiram”.
Reflete ainda Fernando Rosas sobre a “busca de um passado para o presente”, e termina falando sobre “Da desmemória à manipulação da memória”, e concluiu que “esta inquietação agitação veio para durar, pois as tarefas da História e os usos da memória, por caminhos distintos ou cruzados, são obviamente indissociáveis do tipo de sociedade que queremos como presente como futuro”.